Professores dizem que tema é 'inesperado', mas não necessariamente difícil. Eles dizem que estudante pode abordar tanto a produção quanto o acesso da população.
Por
Ana Carolina Moreno, Elida Oliveira e Fabio Manzano, G1

Tema da redação do Enem 2019 é Democratização do
acesso ao cinema no Brasil. — Foto: Inep/Diuvlgação
O tema da redação do Exame Nacional do Ensino Médio
(Enem 2019) é "Democratização
do acesso ao cinema no Brasil".
Segundo professores ouvidos pelo G1,
o tema não estava entre as principais
apostas e discussões nos cursinhos ou redes sociais durante
o ano, e a área de cultura há anos não aparecia no Enem. Mas a surpresa não
chega a fazer do Enem 2019 uma prova difícil para os candidatos.
Já os cineastas ouvidos pelo G1 afirmaram
que a democratização do acesso ao cinema no Brasil ainda está longe da realidade.
Eles citaram argumentos que poderiam ser usados pelos candidatos, como
diversidade de temas nas telas, variedade de produtores na execução dos
projetos e até o valor do ingresso, que em geral é caro no país.
Nas redes sociais, alguns internautas elogiaram o
tema, enquanto outros ficaram felizes de não estarem entre os
candidatos neste ano.
Os estudantes tiveram acesso a textos de apoio para
compor a argumentação, como:
1. um trecho do artigo "O que é cinema", de Jean-Claude
Bernardet;
2. um trecho do texto "O filme e a representação
do real", de C.F.Gutfreind;
3. um infográfico do periódico "Meio e a
Mensagem" sobre o percentual de brasileiros que frequentam as salas de
cinema;
4.
um trecho do texto "Cinema perto
de você", da Ancine.
Análise dos professores
O professor de redação do Sistema de Ensino pH
Thiago Braga, do Rio de Janeiro, disse ao G1 após
o anúncio que o tema é inesperado e não houve discussão tão grande sobre ele
nesse ano.
"Mas é uma discussão importante porque a gente tem o cinema como uma arte que é muito deixada de lado no Brasil, embora muito bem produzida no Brasil", afirmou Thiago Braga, do pH.
Segundo ele, sem os textos motivadores não é
possível saber que enfoque o Enem vai dar ao tema. Braga sugere algumas
abordagens possíveis, desde a produção audiovisual no país até o acesso de
todos os setores da população ao audiovisual, inclusive as famílias de baixa
renda.
A professora Isabela Arraes, do CPV Vestibulares,
de São Paulo, afirmou que, apesar de inusitada, a proposta da redação do Enem
2019 não pode ser considerada difícil.
"Foi compatível com o que o exame costuma cobrar dos candidatos, se considerarmos que o tema sempre traz uma questão de viés social que deverá ser analisada criticamente pelos alunos. A questão foi alvo de discussões na internet, principalmente devido aos últimos cenários envolvendo a Ancine e os cortes na cultura do país" - Isabela Arraes, professora de redação
Ainda de acordo com Isabela, a democratização do
acesso ao cinema é uma questão social muito pertinente.
"Inclusive, dava margem a algumas análises
polêmicas, na contramão do clima de tensão do momento político que o país está
vivendo: assim, o Enem optou por solicitar uma discussão extremamente
importante no que diz respeito à aquisição dos conhecimentos proporcionados
pela indústria cinematográfica", afirmou a professora.
Para o professor de redação Rogi Almeida, do Curso
de Redação, em Teresina, o estudante pode se surpreender porque o tema não foi
abordado em provas mais recentes.
“Eles pegaram um eixo temático que há muito tempo não era abordado, que é cultura. O aluno tem que fazer a problematização para o acesso à cultura e ao cinema e como a partir de um filme se tira várias discussões sociais." - Rogi Almeida, professor de redação
Rogi Almeida ainda diz que é possível usar exemplos
na abordagem. "Um exemplo é o Coringa, um filme a partir do qual se
discute a violência, as doenças psíquicas, entre outros temas.”
Argumentos de cineastas
Bruno Barreto, diretor de filmes como "Dona
Flor e seus dois maridos" e "O que é isso, companheiro?", que
foi indicado ao Oscar de melhor filme estrangeiro, afirma que "estamos
ainda muito longe da democratização do acesso ao cinema brasileiro".
"A arte precisa de dinheiro, mas também de
mecanismos para facilitar o acesso, para democratizar, fazer com que pessoas
com baixo poder aquisitivo tenham acesso ao audiovisual. A maneira realista de
isso acontecer é nas plataformas e na televisão" – Bruno Barreto, cineasta
Para Marcelo Gomes, diretor de filmes como
"Estou me guardando para quando o Carnaval chegar" (2019) e
"Cinema, Aspirina e Urubus" (2005), a democratização do cinema leva o
país a construir uma identidade.
"O cinema é o espelho da nossa cultura. Já foi dito que um país sem cinema é uma casa sem espelhos. A gente tem que democratizar, fazer chegar a todas as camadas da população, não apenas em shoppings com ingressos caros. Milhares e milhares de cidades do Brasil não têm cinema. É uma forma de as pessoas acessarem mais conhecimentos, é fundamental ao país." – Marcelo Gomes, cineasta
A cineasta Laís Bodanzki afirma que a
democratização do acesso ao cinema precisa incluir a diversidade de temas
abordados na tela e também ao ingresso à sala de exibição. Bodanzky é
presidente da SPCine – empresa da prefeitura de São Paulo responsável pelo
fomento, estímulo e difusão do audiovisual na cidade de São Paulo – e diretora
de filmes como "Como nossos pais" (2017), "As melhores coisas do
Mundo" (2010), "Bicho de Sete Cabeças" (2000), entre outros.
"Quando falamos de democracia do cinema, falamos também sobre o que está na tela, quem tem direito de assistir a este filme e quem tem direito de fazer" - Lais Bodanzki, cineasta
Lista de todos os temas de redação do
Enem
·
1998: Viver e aprender
·
1999: Cidadania e participação social
·
2000: Direitos da criança e do adolescente: como
enfrentar esse desafio nacional
·
2001: Desenvolvimento e preservação ambiental: como
conciliar os interesses em conflito?
·
2002: O direito de votar: como fazer dessa
conquista um meio para promover as transformações sociais que o Brasil
necessita?
·
2003: A violência na sociedade brasileira: como mudar
as regras desse jogo
·
2004: Como garantir a liberdade de informação e
evitar abusos nos meios de comunicação
·
2005: O trabalho infantil na sociedade brasileira
·
2006: O poder de transformação da leitura
·
2007: O desafio de se conviver com as diferenças
·
2008: Como preservar a floresta Amazônica:
suspender imediatamente o desmatamento; dar incentivo financeiros a
proprietários que deixarem de desmatar; ou aumentar a fiscalização e aplicar
multas a quem desmatar
·
2009: O indivíduo frente à ética nacional
·
2010: O trabalho na construção da dignidade humana
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